sábado, 6 de dezembro de 2014

Pescaria

depois daquele dia, me perguntei quem é você quando está só. Devo confessar que desejei estar perto pra te olhar sem ser vista (evidentemente). De uma certa maneira, isso já acontece: quando estou com você, tenho a impressão de que não sou vista e que você está sempre esperando que algo mais interessante ocorra nas redondezas para poder sair correndo sem que te julguem um canalha.
 Seu rosto transparece uma espera. Parece-me que você quer que eu lhe mostre alguma habilidade genial escondida nos recônditos do meu bolso, tais como tocar gaita de fole, ou colecionar olhos de vidro, quem sabe ser designer de jóias feitas com dentes de tubarão que eu mate com as próprias mãos e até adestradora de joaninhas. Quem sabe algo que justifique a sua presença efêmera e "ilustre"ao meu lado, uma "reles" mulher normal. De uma certa maneira, eu não ligo. Desde a minha adolescência não perco o meu tempo tentando convencer ninguém de que sou interessante. Mas, por outro lado, fico refletindo se esse combinado entre nós não assemelha-se aos contratos leoninos escritos em letras minúsculas, onde só um dos proponentes é contemplado e não há equanimidade.
Suspeito que minha "invisibilidade"ocorra pelo fato de eu não oferecer nenhum tipo de status agregado. Não alimentar seu ego e seus jogos de retroalimentação. Não representar a musa que seduz seus amigos e todos à volta. Não ser uma princesa delicada nos modos e doce nos gestos.
Eu represento o inesperado. Você não sabe como lidar comigo. E não estou me gabando. Estou constatando.
Seu discurso reforça que você prefere ser refém do mesmo jogo que está habituado. Talvez ele seja assim: conquistar a musa do pedestal, disputar poder com ela, disputá-la com outros,  amá-la e perdê-la para outro que às vezes pode ser um amigo.
 Quando sabemos o caminho das nossas ações basta reproduzí-las, não é necessário refletir se são genuínas.
No entanto, meu corpo quis ter outras tardes como as daquele dia. Porque o corpo sabe quando o toque é honesto e a experiência é válida. Mas, minha cabeça insiste que não devo estar onde não sou tratada como uma mulher de infinitas possibilidades.
O que nos valoriza é nossa subjetividade, e isso só quem não tem preguiça terá acesso.
Penso que a palavra conhecer pede a presença de outros verbos: arriscar, abrir, observar, tocar, olhar,
cutucar, admirar...andam lado a lado.




terça-feira, 25 de novembro de 2014

faltou aquele por do sol

o corpo se conecta de uma maneira tão honesta que nenhuma razão consegue explicar. Nele fica impressa a sinceridade que nenhuma palavra dá conta. Não é possível enganar o corpo. Ele se abre por inteiro quando sente prazer e segurança com outro corpo presente, mesmo que as palavras ditas contradigam tanta intimidade.
O corpo sente saudade de quem não deveria e de toda minúcia que o outro carrega: cheiro, hálito, digitais...
Entre os corpos desenha-se um fio imaginário de ligação. Um fio tênue mesmo que aparentemente não se tenha criado nenhum laço de afetividade profunda.
Um ajuntamento estranho que carrega consigo o suspense e o desejo de reencontro. Um encaixe isento de palavras e cheio de respiros, gemidos, fungadas, lambidas e cheiros.
Um corpo que quer a sincronicidade a seu favor para tropeçar no outro, na chuva, em frente a rodoviária. Mesmo sem saber porque.

domingo, 9 de novembro de 2014

Permissividade

existem várias formas de abuso. Alguns acontecem mesmo sem as pessoas perceberem. Eles são inconscientes e permitidos.
Já consenti vários. Mês passado, por exemplo, tive umas horas de prazer com um rapaz que julgava interessante  e ele apenas falava de suas aventuras sexuais e amorosas anteriores como se eu fosse uma mera vírgula em sua vida excitante e promissora. O pior é que se repetiu por outras vezes. Qualquer conversa era motivo pra ele ressuscitar suas ex-zumbis-peguétes-paixões-de-fim-de-semana-amores- adolescentes- eternos. Uma sucessão tediosa de desrespeito que parecia um exercício-tentativa de delapidar a minha auto-estima claudicante. Quando era por mensagem, piorava bastante, porque era para eu ler apenas. Para ler calada, pois parecia que ele realmente não lia minhas respostas. Cheguei ao cúmulo de dar conselhos amorosos porque acreditei que seríamos amigos e ele parecia um cara legal. Mas, como ser amigo de alguém que sonega informações sobre si mesmo?! E Creio que só tive acesso a 10 por cento de informações realmente relevantes sobre esse boy.  Eu me tornei da noite para o dia uma amiga que o distraía nas horas vagas em que ele sentia solidão. Minha leitura: trata-se de um carente profissional egocêntrico que não se aguenta só e que tem jeito de bonzinho eterno. Um inseguro rapazóla de 30 anos que não tem noção nenhuma desse comportamento que aqui descrevo e que possivelmente continuará reproduzindo.
Acho curioso também que qualquer homem possa propor sexo, apenas pelo prazer do sexo, mas, uma mulher deva ser obrigada a associá-lo sempre a algo mais. Eu não queria amizade, não me entenda mal. Eu propus sexo. Eu fui atrás porque achei ele encantador. Mas, eu não posso querer sexo. Uma mulher querer sexo significa que ela copia os homens, e que consequentemente resultará em um arremedo mal rascunhado e será imediatamente desqualificada.
Fiquei 8 anos com um "bom moço" que me dizia que eu jamais seria uma boa mãe porque eu era "maluca". O "elogio" que eu mais ouvi na vida. Primeiro porque eu tento dizer o que penso sem rodeios e segundo porque penso demais.
Foram tantos abusos que um blog apenas não seria suficiente. O que me faz pensar no cerne da questão: o que posso mudar é a minha atitude. Tenho que diminuir a minha tolerância às ações desprezíveis de cada dia. Tenho que acreditar no meu próprio julgamento. Tenho que confiar na minha intuição.

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

septicemia

se eu tivesse o poder dos deuses, semideuses e demais criaturas viventes na cabeça do homem, eu moveria forças misteriosas que resultariam em uma gigantesca boca enfeitada com mais de 300 dentes podres, afiados e capazes de infeccionar a mais doce lembrança sobre ela...

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

devidamente cortados



tudo acaba, mas, seus dedos estão no meu corpo ainda. Digitalizada em manchas roxas. Desejo que elas fiquem um pouco mais, então esbarro nas quinas das coisas de propósito. Para assegurar que ficarão mais uns dias, pressiono o indicador e conto até 10. Dói. É bom. Só elas foram sinceras. Só elas merecem ficar.

domingo, 12 de outubro de 2014

autocuidado

hoje eu acordei com vontade de ser boazinha comigo: me arrumo linda em preto para me levar ao cinema como uma mãe zelosa leva seu filho ao parque para o banho de sol diário. Escolho um filme na esperança de ser adequado à minha altura e meu discernimento.  
Espero ser legal pra mim até o fim desse dia...sou otimista. Nem sempre me odeio.

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

sobre o tédio e o fumo


 café crème me lembra Búzios. Você disse que as fuma quando quer lembrar de mim e isso me lembra como sou esquecível, tendo em vista que as cigarrilhas já devem ter acabado e sei que você não as comprará novamente.
Enquanto isso, eu fumo uma das que sobraram com o tédio das noites mal dormidas lembrando de quando eu era rica, metida a gringa israelense que sorria e passava o cartão de crédito como se não houvesse amanhã. E desse ponto, penso na minha lápide (se minha família não quiser gastar dinheiro com a cremação) e na frase que eu gostaria de ostentar: "Fui feliz um dia".

domingo, 28 de setembro de 2014

cerevisia

abraçada em uma latinha gelada tento não pensar no tempo de tudo. A vida tornou-se um trava-língua-eterno, um misterioso clichê.
E eu só querendo, por alguns minutos, que as inteligências artificiais dominem tudo e escolham as palavras e os comportamentos mais adequados pra cada situação. Quem sabe esse mundo parece menos estúpido...

terça-feira, 9 de setembro de 2014

o extraordinário grão de areia

algumas pessoas esperam encontrar companhias que sejam reluzentes em ideias impressionantes e se mostrem tão únicos quanto os grandes gênios da humanidade. A simplicidade não me parece um item importante na lista de adjetivos almejados pela maioria que busca um partner.
Por uma pessoa simples entenda-se alguém desenrolado, tranquilo, de boa, que deixa a vida entrar suave pelos poros e fluir naturalmente.
Será que existe gente assim de verdade? Gente que não pareça modelo de propaganda de academia de Yoga?!

domingo, 31 de agosto de 2014

Mun ha

6 itens mofados dentro da geladeira e uma leve falta de apetite resultam em um jantar vergonhoso: 4 pirulitos (dois de abacaxi, 1 de uva e 1 de laranja)...
Enquanto Bukowski se orgulhava de encher a cara de álcool eu não deveria alardear sobre o excesso de açúcar e a minha dificuldade em administrar uma dispensa.
É quase um atestado de incompetência consigo mesma. Bom pra pensar profundo...e mudar tudo de novo.

sábado, 2 de agosto de 2014

voltar rapidamente para algo

hoje, passeando e bebendo sol,  lembrei de um dia em que eu estava descalça, com um sapato em cada mão e você disse: "cuidado, pode ter escorpião escondido embaixo das folhas secas. Coloca o sapato, vai". Me deu saudade enorme do teu amor torto e confuso que enjoa em 5 minutos e passa a amar outras/os, porque a mim, de repente, perdeu a graça.
Daí, pensei que eu te beijaria lentamente só pra conferir se no gosto da tua saliva tem alguma gota-memória de mim, porque: sim, eu quis você alí, ao meu lado, às 10 da manhã

sábado, 12 de julho de 2014

ouro de tolo

penso que um coração falido e inconsciente é aquele que só quer o outro um casulo oco impregnado de um belo verniz, assim sendo, mero objeto de desejo, dominação e atenção.
 A esse exercício de poder costumam denominar amor.
O outro (animal caçado) só lhe serve enquanto um "coração (?!)" ainda não capturado. Por outro lado, o ato de apaixonar-se torna essa mesma presa: refém, logo, desinteressante.
Mas, se um segundo predador aparece, a presa volta a ser atraente, desse modo,  motivo de competição, resulta num trofeuzinho, ainda que finja que não, (frágil e a mercê dos humores alheios) até que algo mais interessante apareça.
A mim essa dinâmica arcaica e doente já não interessa faz tempo, simplesmente porque não evolui e trata ambos participantes como seres ordinários e substituíveis.
Não existe algo além? Sagrado e desprovido de ilusões em que a entrega não decorra de um acordo leonino, escrito em letras minúsculas onde apenas um será beneficiado? Não existe relação onde seja possível viver sem acusações, mágoas, adestramentos e artificialismos?
Minha utopia é um amor justo e nesse sentido livre. Um amor que abraça, inclusive, a inexistência.

sábado, 5 de julho de 2014

(entregue-se)

abro teu peito a unha
deposito meu coração
Junto ao seu, agora, reordenam-se
 Veias pulsam em ritmo justo
somos um, mas, sabemos: somos Dois
Viveríamos ambos sem esse amor
 contudo, vivendo-o somos mais fortes,
enfim.

domingo, 29 de junho de 2014

6B


o melhor de todos os lápis chama-se: 6B. Se eu fosse um lápis eu me casaria com ele.
Porque 6B vai amanteigando o papel e os traços vão surgindo soltos, felizes... Tão macio que deixa rastros ao redor e os dedos desavisados vão digitalizando a folha... O que nem sempre é ruim. Pra isso tem limpa-tipo.
 Com 6B eu quero desenhar o mundo, rabiscar as laterais das coisas, escrever obscenidades nas paredes brancas, desenhar amores que ainda terei, garatujar a calça jeans, fazer dentes de vampiros em cartazes de políticos...
Com 6B eu quero sentar a bunda na cadeira e desenhar até os dedos caírem podres...
Por um mundo onde o lápis 6B faça parte da cesta básica.

terça-feira, 17 de junho de 2014

amor verdadeiro

uma criança pergunta: como é ser adulto? Você gosta?
Eu respondo: é chato
A criança pergunta novamente: porquê?
Eu: porque posso fazer o que eu quiser...
Criança: tipo o quê?
Eu: almoçar brigadeiro
Criança: e ter dor de barriga?
Eu: sim, talvez.
Criança: sua mãe não disse que dá dor de barriga?!
Eu: sim
Criança: e você não obedeceu?
Eu: sim
Criança: porquê?
Eu:  minha mãe não consegue gostar de mim. Então, nunca sei se ela está com inveja da minha liberdade ou se foi um conselho sincero
Criança: porque ela não consegue gostar de você?
Eu: porque a mãe dela não conseguiu gostar dela
Criança: e você? Consegue gostar dela?
Eu: sim, consigo...eu acho
Criança: e quem gosta de você?
Eu: você?!
Criança sorrindo: sim!

sexta-feira, 30 de maio de 2014

Hemidactylus mabouia

cartografei meu corpo com lupa e desenhei um mapa pra não perder detalhes...  E enfim, me aproximar do que eu sempre fugi: o esqueleto, as carnes, a pele, a sombra.
Fotografei cicatrizes, hematomas e a textura das camadas mais superficiais. Concebi defeitos e observei as tatuagens que a própria vida se encarregou de construir.
Percebi a imagem que não corresponde ao que desejam de mim e me permiti não ser estandarte de beleza padrão, ou qualquer outra bobagem parecida. Prefiro não me confundir.
 Quero olhar no espelho e ver refletidas as veias, o coração pulsante, feito lagartixa albina: transparente figura-fundo. Digna. Inteira. Única.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Morto não paga passagem

10:32 do dia 6 de maio desse ano. Asa sul na altura da 16, espero o baú pra rodô. Olho o céu. Respiro fundo. Um primeiro baú para. Não é o meu. Um homem forte, jovem, baixo, belo e negro, usa calça e camisetas pretas. No pé meias brancas gastas e sujas. Ele se joga por trás do ônibus. Intenciona não pagar. O motorista o expulsa. Ele é humilhado. Repete a cena com mais dois ônibus sem sucesso. Conversamos:
Eu- oi, toma esse dinheiro! Entre pela frente, por favor.
Ele - não. Obrigado, moça. Eu tenho dinheiro. Além do mais, morto não paga passagem.
Eu- como assim?
Ele- eu não quero gastar com o baú.
Eu- porque?
Ele- porque vou gastar com pedra...crack, sabe?
Eu- entendi...
Ele- se eu pegar seu dinheiro vou comprar mais pedra... Eu tô morto, moça. Morto não paga passagem.
Eu - obrigada pela honestidade.
Ele- de nada. Só não achei certo te enganar.
Eu- (faço a pergunta clichê com muito constrangimento) já pediu ajuda?!
Ele - acabei de sair de uma clínica...saí ontem doido pra fumar pedra...
Eu- puxa...que triste...
Ele- (com o olhar longe) muito triste.... Triste demais.
Ele continua sua jornada inglória. Sigo meu caminho pra asa norte.
Triste.

segunda-feira, 5 de maio de 2014

carne crua

discursos consistentes não me interessam faz tempo, pois me dão a ligeira impressão de que em sua maioria, são baseados em excelente bibliografia (além de uma boa alimentação e conta bancária) e pouca referência prática conectada com as dificuldades diárias de qualquer cidadão/ã.
 Um dos meus maiores medos na vida é me distanciar da "realidade" crua. Dessa do estudante que acorda 4 da manhã para frequentar uma escola menos pior; do rapaz que almoça bananas porque é mais barato; ou da garota de 15 anos que fugiu de casa para não ser mais molestada.
A vida é boa no meu quadrado, mas, isso não pode me fazer esquecer que sou também o homem que dorme ao relento e conversa sozinho envolto em seus trapos fétidos. Esse homem amparado apenas pelos braços do frio mortal do outono que eu tanto amo...
Os buracos que eu tropeço todos os dias  nessas calçadas quase inexistentes, são como chacoalhadas na alma, essa, que as vezes dorme em seu próprio umbigo. Não é o budismo, o taoísmo ou a meditação transcendental que me lembram que todos/as somos um/a e sim os alagamentos na rua e os banhos de leptospirose que não perdoam ninguém.
Essa vontade de nunca perder de vista o avesso das coisas reverbera para todas as áreas da minha vida. Assim sendo, um lado meu quer escorregar as mãos no amor e escavar com as unhas até chegar nas memórias mais sombrias, mais brutas e mais claras. Esse mesmo lado quer apenas o ponto sensível de tudo.


domingo, 27 de abril de 2014

Lar misterioso lar...

se meu corpo fosse uma casa, ela seria cheia de corredores e portas fantasmagóricas que se fechariam sozinhas rangendo as dobradiças só para assustar.
Se meu corpo fosse uma casa, o assoalho seria branco e preto e afundaria se acaso alguém pisasse no lugar errado...
Se meu corpo fosse uma casa, as janelas seriam tortas imitando o expressionismo alemão e teriam dentes de crocodilo para triturar e cuspir tudo que não valesse a pena. Se meu corpo fosse uma casa, suas paredes seriam transparentes, mas, tão impenetráveis quanto o mais duro e resiliente metal. Se meu corpo fosse uma casa, não teria móveis, portanto, cada cômodo seria semelhante e ao mesmo tempo distinto, confundindo labirinticamente qualquer olhar. 
Se meu corpo fosse uma casa, ele teria um quintal cheio de Trombetas de anjos rosados, Flores de seda,  as magentas Cristas-de-galo, as rubras Lágrimas de Cristo,  muitos Bastões - do - Imperador (as preferidas de Burle Marx), um lado tomado por Gloxínias alaranjadas e Flores-morcego penduradas em árvores frutíferas. Um jardim feito para se perder...
Se meu corpo fosse uma casa, ele não teria um tapete escrito bem-vindo, porque torno-me a cada dia mulher desconfiada e segura daquilo que quero e não quero.
As portas não se abririam tão fácil, nem tão pouco aos pontapés. Nem chaves, nem palavras mágicas, nem poemas de amor, nem bajulações. 
As portas saberiam automaticamente para quem deveriam abrir-se.

domingo, 30 de março de 2014

Carta aberta para minha mãe

minha cara, quisera eu ter tido o destino de ser sua mãe. Evidente que essa proposta só me seria interessante se fosse realizada no momento em que me encontro.
Eu poderia também ser uma mulher desconhecida que adotasse o seu abandono e o transformasse em acolhimento e confiança.
Eu te faria penteados com fitas e manteria seus cachos intactos feito masterpieces.
Sua pele seria hidratada e climatizada imitando os cuidados dados às orquídeas mais delicadas e selvagens que nascem nos topos das montanhas.
Eu cuidaria para que você enxergasse o quão extraordinária é. Eu cuidaria para apagar essas ranhuras de tristeza que brilham reluzentes no fundo verde (m)aguado dos teus olhos. Eu cuidaria para que esse silêncio mortificante ficasse tão leve que saísse voando pra nunca mais voltar.
 Você teria meu peito para descansar as esperanças de um futuro doce. Você seria o que nasceu pra ser.
Eu extinguiria a maldição do desamparo, essa, que nos ronda feito zumbis há duas gerações.
E enfim, você me amaria.

sábado, 29 de março de 2014

transumano


(Inspiração desse post: Joe Hisaishi - Piano and Nine Cellos - Madness)

abocanho o sol  pra ver seus traços de luz atravessando cada poro que me integra. Queimo eterna nas profundezas desse paraíso, voando feito cinza em brasa, numa alegria suprema...

sexta-feira, 28 de março de 2014

venoso

pulsa o azul asfixiante nesses tempos estranhos. Tinge o peito, feito aquarela e leva a última gota de ar dos amantes.
Reza teu Deus. Pede. Implora. Nada há de salvar quem não toma pra si o agir.  Lê teus romances. Malha teu Judas. Mugi a última letra do teu alfabeto moribundo. Finge e canta esse teu caminhar morno. Leva pra longe esse teu descaso que a vida já está por demais ciano.

segunda-feira, 24 de março de 2014

March

existe um vento único, filho das manhãs de outono...de todos,  o que eu mais prezo. É vento de invasão, que limpa até os cantos das unhas, faz ranger os cabelos e penteia os ossos. De um frescor eterno e carregado de uma dúvida fabulosa, canta o que está por vir...

segunda-feira, 17 de março de 2014

em linha torta

faz uns 5 anos pelo menos, que eu não me interesso por alguém de maneira encantada, dessas que quer desvendar, que quer deixar um bicho-presente-morto na porta pra agradar. Dessas que não dão medo, porque de um jeito estranho você CONFIA ( sem saber muito o que te move). Não enxerga complicações porque  intui que tem algo ali, esperando estranhamente por você. Entende que desses lugares obscuros, de repente, surgem beijos que liquefazem o corpo e esfriam o estômago.

quinta-feira, 13 de março de 2014

clara est la nuit

existe uma calma solene que se confunde com frieza e distanciamento...um engolir lento, uma respiração suave e regular... Uma linha reta longe, fixa, que executa apenas sua função de criar profundidade à cena...a certeza cruel e boa de que nada escapa sem que haja uma função...uma segurança impenetrável, quase tola, tão fulgaz... dura um suspiro.

domingo, 23 de fevereiro de 2014

"tratado" acerca dos excrementos

cuspir, vomitar e fazer gargarejo com coisas estranhas, são hábitos nojentos que me salvam. Hábitos que deveriam ser inconfessáveis.  Mas, fico pensando em meus sobrinhos, quando forem adultos e eu, a tia morta e louca... Afinal, isso aqui é um pequeno museu de mim. Um museu de pequenas recordações. Sórdidas, tristes ou iníquas. Algumas felizes. Quero que eles saibam que eu fui uma mulher sem modos. Uma selvagem. Livre até para ser mal educada, se assim o quisesse. 
Eu, que poderia ser uma fábrica de catarro, haja visto o tanto de derivados do leite que eu consumo. Lactose me mata. Mas, me mata menos do que comer bicho morto. Comer cadáveres de outros animais não é pra mim. Não é da minha natureza. Nunca foi. Sinto falta de comer peixes, é bem verdade. Minha fraqueza. Eu aceito isso. Tremo de pensar na moqueca de peixe do meu Pai... E tem comida japonesa... 
Mas, tudo é uma questão de costume... E de escolhas. Gostaria de ter o mesmo discernimento e disciplina em outros aspectos de minha vida...

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Oi, 2014

meu sorriso é um risco. Lábios fechados e ariscos pra qualquer tipo de ilusão. Nas laterais escorre um fio de mel que pinga ininterruptamente e me lembra que o amor, a luxúria e a festa serão sempre bem-vindos e nunca importará nenhum tipo de julgamento.
Não há frustração que me mate, não há morte que me apague. Não há situação que eu não possa, nem lágrima que me afogue. Nenhum abandono me definhará. Pois, quem cuida de mim é o mistério.
Minha armadura: a alegria, minha liberdade: o guia, minha espada: a intuição. Sou tão forte quanto fraca. Consciência: sempre rainha. Saúde: minha lei.
Minha fé é onda de mar, ora vai, ora vem, mas, me banha sempre em abundância.
Amém.